Na gestão de uma empresa, nem sempre é fácil criar alinhamento e engajamento em torno de metas mensuráveis e dinâmicas em toda a organização.
Mas uma metodologia pode ajudar nesse aspecto. Trata-se do OKR (Objectives and Key Results; em português, Objetivos e Resultados-Chave), uma abordagem de negócios, criada na década de 1980, pelo ex-CEO da Intel, Andrew Grove.
Anos depois, a metodologia foi redescoberta pelas startups do Vale do Silício e introduzida com sucesso no Google por John Doerr, um conhecido investidor de risco.
Uma das definições de Doerr é a de que o OKR é uma metodologia de gestão que ajuda garantir que a empresa concentre esforços nas mesmas questões em toda a organização.
No Brasil, grandes empresas e startups de tecnologia já adotam a metodologia. “A cada dia, inúmeros empresários, executivos, gestores e jovens empreendedores estão contado com os OKRs. Alguns exemplos de empresas que usam esse conceito no País são Nextel, a Sulmérica, Burger King, Positivo, além do Google”, afirma o consultor de empresas e diretor da Herrero Consultoria, Emílio Herrero Filho.
Segundo ele, os OKRs estão sendo usados pelos primeiros adotantes (early adopters) e, com os cases de sucesso se disseminando, a abordagem se transformará em hype no segundo semestre de 2020.
“Isso acontecerá quando as empresas revisarem seus planos estratégicos, ou, melhor ainda, quando precisarem se reinventar para os novos tempos pós-pandemia”, projeta.
A reportagem do Portal de Notícias GS1 Brasil esclareceu os principais conceitos da metodologia com Herrero Filho, que lançará, em breve, o livro Os OKRs e as Métricas Exponenciais – A Gestão Ágil da Estratégia na Era Digital (Editora Alta Books).
Acompanhe os principais insights do especialista.
O que é OKR
OKR está relacionado a estabelecer objetivos e transformá-los em resultados-chave.
Segundo Herrero, neste conceito, o objetivo é caracterizado como aquilo que as pessoas pretendem alcançar quando realizam uma ação, fornecendo um direcionamento e uma compreensão sobre a ação em todos os níveis da empresa. Já os ‘resultados-chave’ são a maneira de atingir os objetivos medidos por indicadores.
Tipos de objetivos
Nesta metodologia, um objetivo é específico, mensurável, realizável, relevante e deve ter um tempo determinado para sua realização.
Herrero cita alguns exemplos de objetivos: elevar a receita de uma empresa na região Sul em 20% até o final de 2021; introduzir novos produtos por meio de parceria com três startups de tecnologia até o primeiro trimestre de 2021; ou criar uma plataforma de negócios para escalar a venda de produtos (próprio ou de terceiros) até o final de 2020.
De modo geral, há dois tipos de objetivos: compromissado e aspiracional.
O compromissado (roofshot) reflete a melhoria contínua (por exemplo, melhorar a produtividade em 10%) e não provocam grandes transformações na empresa.
Já o aspiracional (moonshot) é um objetivo ousado e muito difícil de ser alcançado. “Porém, estimula as pessoas a pensarem diferente, com um mindset de desenvolvimento que rompe com o status quo”, explica Herrero.
Segundo ele, alguns exemplos de objetivo moonshot seriam: descobrir uma vacina contra a Covid-19 até o final de 2020; reduzir o ciclo de lançamento de um novo produto de 18 meses paras seis meses; os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), das Nações Unidas; o lançamento do automóvel autônomo; o desenvolvimento de energia limpa para todos os setores; ou lentes de contato inteligentes para medir as condições de saúde das pessoas.
Resultados-chave que os OKRs podem proporcionar
Os resultados refletem o modo como a organização vai alcançar os objetivos. Eles são quantitativos e demonstram se o gap de desempenho foi superado por métricas bem definidas.
“Os resultados possuem um prazo pré-determinado para sua conclusão, suportado por cronograma”, esclarece Herrero, acrescentando que os OKRs também estimulam o engajamento das pessoas com as prioridades da organização.
Nesse sentido, torna-se um importante instrumento de comunicação entre diretores, gestores e colaboradores.
Herrero explica que, tradicionalmente, o planejamento estratégico, ou mesmo a definição dos objetivos de uma organização é determinado pela alta direção, sem a participação de profissionais de outros níveis da empresa (abordagem top-down).
“Como motivar e engajar as pessoas em objetivos que foram criados pelos diretores, sem a participação delas? Será que esses objetivos inspiram as pessoas? Esses objetivos têm a cara de serem oficiais, convencionais e até burocráticos – eles não conseguem inspirar e motivar as pessoas”, diz.
Em contraste, os OKRs apresentam uma abordagem bottom-up. “A partir dos objetivos da organização, as pessoas e os times de trabalho, e também de projetos, definem com autonomia o que eles julgam importante para atingir os objetivos da organização – desde o primeiro dia do projeto. Cada profissional sabe como seu trabalho está conectado com a estratégia e as prioridades da companhia. Em seguida, todos os OKRs são comunicados para a empresa, são transparentes e geram confiança. Todos sabem, inclusive, quais são os OKRs dos diretores”, esclarece o consultor.
Diferenças entre OKRs e KPIs
Os OKRs não significam a elaboração de uma lista de objetivos. “Muitos gestores, equivocadamente, imaginam que é suficiente reunir um grupo de pessoas, numa confortável sala, e definir os objetivos da empresa”, pondera Herrero.
No entanto, os OKRs apresentam um sequenciamento a ser respeitado. “Considera-se, em primeiro lugar, o propósito transformador (na forma de missão ou visão); em seguida, a estratégia empresarial (o desafio a ser superado); e, por fim, a definição dos objetivos e dos resultados-chave”.
Já os KPIs (Key Performance Indicator; em português, Indicadores-Chave de Desempenho) são um conjunto de medidas que ajudam a avaliar resultados e comparar e rastrear o desempenho de uma atividade, processo, projeto e organização.
“Os KPIs ajudam a entender o processo de criação de valor de uma empresa”, diz o especialista.
Para o melhor entendimento entre os dois conceitos, Herrero fornece um exemplo prático. “O OKR é o veículo da organização para você se deslocar do ponto A até o ponto B. Já os KPIs são como os instrumentos localizados no painel do carro, como o volume de combustível, o nível do óleo no motor, ou ainda, o GPS ou o navegador Waze”.
Vantagens dos OKRs
Na visão de Herrero, a abordagem dos OKRs ainda está em evolução. O conceito se desenvolveu, principalmente, nas startups do Vale do Silício e, em seguida em grandes corporações, como Intel, Google, Microsoft, Amazon, Spotify, LinkedIn, Facebook e Tesla.
“O que nós temos em termos de abordagem são: o livro de John Doerr (Avalie o que Importa); o livro de Paul Niven e Bem Lamorte (Objectives e Key Results) e o livro de Cristina Wodtke (Radical Focus). Dessa forma e, em conjunto, temos experiências das empresas mencionadas, que foram retratadas em livros, porém não há uma metodologia consagrada. Não há um passo a passo consagrado e as melhores práticas”, explica.
No entanto, é possível elencar as principais vantagens da metodologia OKR:
- Fácil entendimento, o que facilita a introdução na organização;
- Objetividade e rapidez em relação às tradicionais metodologias de gestão de desempenho;
- Direcionamento das pessoas para o foco da organização no que é mais importante para o negócio;
- Estabelecimento de um forte vínculo entre os objetivos de curto prazo e os objetivos de longo prazo;
- Transparência dos objetivos em todos os níveis da empresa, facilitando o alinhamento entre as áreas da organização.
Desafios dos OKRs
Os OKRs não são tão simples e fáceis de implementar. “Eles não significam a elaboração de uma lista de objetivos, muitas vezes não integrados entre si e nem direcionados para o foco do negócio”, alerta Herrero.
Outro problema está associado à quantidade de objetivos e resultados. Quando o time (ou squad) dos OKRs vai iniciar os trabalhos, é preciso que o propósito da organização e a estratégia empresarial estejam bem claros.
Caso contrário, haverá uma grande quantidade de objetivos operacionais que vão demandar muito trabalho.
“Os OKRs não significam levar às pessoas a realizarem incontáveis tarefas, mas, sim, entregar os resultados-chave”, reforça Herrero.
Aplicação nos negócios
Como qualquer metodologia de gestão empresarial, Herrero alerta que é preciso levar em consideração alguns pontos importantes, como:
- O estágio do ciclo de vida da empresa – se está em fase de crescimento, maturidade ou declínio;
- As características do negócio em si e do ecossistema em que está inserido;
- O grau de intensidade tecnológica associada à escalabilidade das operações e ao crescimento lucrativo das receitas;
- Os principais aspectos da cultura da organização e;
- O mindset dos dirigentes, gestores e colaboradores.
Como adotar os OKRs
Emílio Herrero aponta quatro etapas principais:
- Primeira: consciência de que a empresa precisa mudar rapidamente, pois a estratégia competitiva pode estar desatualizada.
- Segunda: capacitar as pessoas que vão participar do processo. Este é um fator crítico de sucesso, muitas vezes esquecido.
- Terceira: formação dos times de trabalho multifuncionais (squads), com elevado grau de empowerment.
- Quarta: colocar os times para trabalhar, definir os OKRs nos níveis da organização, das áreas de negócios e dos indivíduos. Também é muito importante a comunicação e a transparência dos OKRs por toda a organização.
*Entrevista concedida ao site da Associação Brasileira de Automação.